Num panorama musical onde tantos procuram fórmulas fáceis, há quem opte por rasgar o caminho à unha, com verdade, intensidade e uma boa dose de inquietação. Nascidos em Loures, os JAVISOL [Destaque no Ecletismo Musical AQUI] trazem na bagagem um som que funde o peso emocional do fado com a energia crua do rock alternativo, e um álbum de estreia que mais parece um grito de alma.
Com uma entrega vocal arrebatadora, Tiago Jesus, o criador deste universo sonoro, guia-nos por paisagens emocionais densas, onde as palavras oscilam entre a reflexão profunda e a urgência de gritar para não sufocar.
Na conversa que se segue, mergulhamos no universo da banda: falamos de música, de identidade, de feridas abertas e da coragem em as expor. Porque há discos que não se ouvem — sentem-se.
ECLETISMO MUSICAL (EM): No mundo dos catálogos e rótulos musicais, onde colocam JAVISOL?
JAVISOL: Acima de tudo somos uma banda Rock, mas com muitas outras influências, do Grunge ao Fado, do Punk ao Folk, uma mistura de tudo o que mexe connosco.
EM: A ligação ao fado é evidente nas vossas composições. Colaborar com artistas do fado tradicional para explorar ainda mais essa fusão é algo que está nos vossos planos futuros?
JAVISOL: Sem dúvida, a ideia duma colaboração deste género já foi tema em várias conversas de banda, pois temos muita curiosidade de ouvir como seriam interpretadas as nossas músicas por artistas, não só do fado tradicional, mas também do novo fado e suas ramificações.
EM: O nome JAVISOL remete à clássica lixívia, mas também pode ser lido como ‘já vi sol’. Considerando a carga dramática das vossas letras, esse nome é também uma metáfora para alguém que já conheceu a luz e agora percorre as trevas da sua mente?
JAVISOL: É uma pergunta pertinente, a verdade é que o nosso nome veio mesmo da marca javisol, mas pensar em ‘ja vi sol’ é muito natural e dado o contexto das letras, também deu mais segurança na escolha definitiva do nome. Por vezes, parece que a vida já foi muito mais luminosa e podemos perder-nos nesse saudosismo. Quando não conseguimos ver essa luz, é fácil caír nas trevas, nos pensamentos menos bons, e é importante saber navegar nesses pensamentos e também procurar a luz quando estamos nas trevas.
EM: As letras abordam temas de saúde mental e emoções cruas. Como equilibram a vulnerabilidade pessoal com a exposição pública que a música proporciona?
JAVISOL: Não existe diferença na pessoa que somos em palco e na que somos no dia-a-dia. Essa exposição é apenas uma consequência de fazer música, pois os nossos problemas e dores acabam por ser combustível na criação desta.
Gostávamos de consciencializar e sensibilizar o público para a importância de zelar pela saúde mental, a nossa e a das pessoas à nossa volta, porque infelizmente ainda há muito estigma em relação a isto e muita gente sofre em silêncio.
EM: Há uma sensação de urgência nas vossas músicas. Sentem que há algo que estão sempre a tentar dizer antes que seja tarde?
JAVISOL: Sim, sem dúvida, estas canções são desabafos, são aquele respirar fundo quando estamos na lama, são o que nos ajuda a lidar com o que se passa nas nossas vidas e a verdade é que deitar cá para fora antes que rebente e pareça que o fim do mundo chegou, cura.
EM: Sentem que fazem música para que os outros vos entendam, ou para vocês mesmos se entenderem melhor?
JAVISOL: Será sempre para nos entendermos melhor. Quanto mais nos conhecemos intimamente, mais nos aproximamos de um local comum a todos – sentir – e, por consequência, também fazemos com que nos entendam melhor.
EM: Em “A corda bamba” (3º single do álbum de estreia) cantam “caminho na corda há vários anos, e finjo que me equilíbro”. Essa é a realidade do artista independente em Portugal? A música tem de ser um hobby porque é preciso pagar as contas e cada um tem uma atividade profissional diferente? Como lidam com isso?
JAVISOL: É sem dúvida a realidade dos artistas em Portugal – de qualquer meio das artes. Falando da cena musical, parece que para quem não tem já milhares e dezenas de milhares de fãs é muito difícil romper a corda ou saltar fora. A música não tem que ser um hobby – há pessoas a querer ouvir e apoiar bandas de todos os géneros de música. A música é um bem essencial e é cultura. Em JAVISOL, temos o Ricardo e o João com outro full time job – apesar disto, a música não é considerado um hobby por nenhum de nós e quer em estúdio ou em palco entregamos-nos todos da mesma forma.
EM: A propósito, qual consideram ser o «estado d’arte» da música feita em Portugal?
JAVISOL: Nunca se fez tantas e tão diversas coisas, mas também vivemos numa era onde se perdeu algum amor à camisola. Nunca se massificou tanto a fórmula com o objectivo de estar aliado à indústria da música e ao que ela pede neste momento – quem vender mais é quem passa na rádio.
EM: Que nomes colocavam no vosso “Festival Ideal”? (Vivos ou não)
JAVISOL: Para não ser um festival de uma semana, tentámos resumir a 1 nome internacional e 1 nome nacional por membro da banda:
Red Hot Chilli Peppers, AudioSlave, Led Zeppelin, Radiohead, Amália Rodrigues, José Afonso, Tara Perdida e Toranja são alguns dos nomes que mais gostávamos de ver ao vivo.
EM: Se tivessem de identificar os 5 melhores álbuns de sempre, qual era a vossa escolha? E porquê?
JAVISOL:
Sam the Kid – Pratica(mente)
Um álbum icónico da música portuguesa, com letras super relevantes e uma narrativa coerente. Leva-nos a passear entre a nostalgia, o sonho e a realidade.
Red Hot Chilli Peppers – Blood Sugar Sex Magic
Na nossa opinião é um álbum revolucionário, moldou muito o som daquela época , será o chamado punk moda funk?
Pink Floyd – The Wall
Talvez um dos álbuns mais presentes em listas destas, mas sem dúvida um favorito para quem gosta de ouvir um disco do início ao fim. Mais uma vez, narrativa excelente e uma produção super atenta ao detalhe. Um clássico.
Nirvana – Nevermind
Daqueles discos que mudaram o mundo, provavelmente não saberíamos como fazer a música que fazemos se não tivessemos crescido com ele.
Radiohead – In Rainbows
Talvez o último álbum ainda enraízado no rock, In Rainbows deu-nos das músicas mais bonitas da banda sem perder o headbang ao longo do disco.
EM: Quais são os vossos planos para os próximos meses? Por onde irão andar?
JAVISOL: Em breve vamos anunciar mais datas, vamos a sítios onde ainda não tocámos e estamos ansiosos, é incrível poder conhecer o país enquanto mostramos a nossa música. Estamos também a pensar em gravar uma sessão ao vivo, talvez até em acústico.
Agradecimentos:
JAVISOL
Raquel Lains (Let’s Start a Fire)
Fotografia Capa: Tuff
No Comments Yet!
You can be first to comment this post!